BanyanGlobal

Empresas Familiares parte 3: o poder de compartilhar informações

A comunicação – ferramenta fundamental para o êxito dos negócios – precisa ser feita a partir de um plano que definirá quais públicos serão informados e qual a prioridade em atingi-los

 

Nas partes 1 e 2 desta série, abordamos como as empresas familiares podem ser frágeis ou resilientes, dependendo da forma com que os proprietários se alinham e exercem seu comando. Introduzimos o conceito dos 5 Direitos Fundamentais que resultam da propriedade de um negócio: desenhar (qual será a configuração da sociedade?), decidir (Como vocês definirão a governança?), valorizar (Qual será a definição de sucesso para vocês?), informar (O que vocês vão – ou não – comunicar?) e transferir (Como vocês farão a transição para a próxima geração?). Discutimos os direitos de decidir e de valorizar. Nesta terceira parte, discutiremos o poder da comunicação em empresas familiares.

O que você vai – ou não vai – comunicar?

As empresas familiares dominam cerca de 85% dos negócios no mundo e representam entre 60% e 70% da força de trabalho na maioria dos
países. Donos e donas de negócios familiares, esse motor da economia global, têm muitos direitos. E um deles, seguramente, é o de decidir o que informar a outras pessoas.

Afinal de contas, a empresa é de propriedade privada. Para muitas famílias, no entanto, o instinto de reter informação é imenso. Acionistas têm medo de compartilhar informações sobre o negócio, e isto é compreensível, principalmente se há risco de despertar interesses duvidosos ou gerar perda de vantagem competitiva para o negócio. Seguramente, essas preocupações são válidas, mas acreditamos que vale perguntar: quais são as consequências de não compartilhar informação?

Relações de confiança, construídas ao longo do tempo, são um dos ativos mais valiosos em um negócio familiar. Estamos falando de relações não só entre acionistas e família, mas também com grupos que se tornam parte da família estendida – funcionários, clientes, fornecedores e outros stakeholders. O valor real destas relações é difícil de entender: elas tornam muitas coisas possíveis, ou impossíveis.

E a comunicação, vale dizer, é peça crítica e fundamental para construir essa confiança. É natural hesitar, e até mesmo oscilar, na escolha entre privacidade e transparência em um negócio familiar privado. Mas algumas informações podem ser compartilhadas sem o sacrifício da privacidade.

É possível compartilhar informações que não sejam financeiras, tais como quais são os produtos chave, unidades produtivas, papéis e responsabilidades na governança, principais acordos (acordo de acionistas, constituição familiar), políticas (de empregabilidade familiar, de dividendos), história da família etc.

No entanto, não é obrigatório – nem desejável – compartilhar tudo ao mesmo tempo com todo mundo. Mas um plano de comunicação bem pensado, seguramente, ajudará a balancear transparência e privacidade, favorecendo a construção de confiança com seus stakeholders mais importantes.

Com quem compartilhar informação?

  1. Acionistas atuais – Em algumas famílias, os acionistas têm diferentes níveis de envolvimento. Enquanto alguns podem trabalhar no negócio, outros podem ser membros do Conselho de Administração, e outros podem ser acionistas passivos. Isto pode significar grande diferença de conhecimento e compreensão sobre o negócio. Sendo assim, é preciso tomar bastante cuidado com as consequências de deixar os acionistas passivos “por fora”. Negócios crescem mais fortes quando apoiados e financiados por acionistas dispostos a comprometer seu capital no longo prazo.
  2. Futuros acionistas da próxima geração – Um dos maiores medos dos donos de negócios familiares é que, de alguma forma, seu sucesso crie uma próxima geração de herdeiros mimados. Esta preocupação é válida em algumas situações, mas é possível compartilhar informações valiosas (e que nãos sejam financeiras) para a próxima geração. Se blindar os representantes da próxima geração de conhecer os negócios da família, o empreendedor estará falhando em prepará-los para serem acionistas. Estará também perdendo a oportunidade de construir o vínculo emocional deles com o negócio (e uns com os outros), e arrisca limitar quanto de interesse, paixão ou talento eles investirão nos negócios.
  3. Cônjuges – Cônjuges, também, podem prover talento e expertise para o negócio familiar e, além disso, têm um papel crítico ao criar a próxima geração, podendo também influenciar o interesse de seus filhos nos negócios familiares. Um cônjuge que compreende os objetivos dos acionistas, o legado e os valores da família, bem como os planos de sucessão pode garantir um apoio valioso.
  4. Funcionários – Alguns donos compartilham informações com funcionários somente quando extremamente necessário. No entanto, muitos negócios familiares veem benefícios no engajamento e alinhamento que é gerado a partir de uma maior abertura com funcionários. Estes passam a se comportar mais como acionistas e menos como mão de obra.
  5. Público – Defensores da divulgação do mínimo de informação possível em negócios privados preocupam-se com os riscos para a segurança da família e para a sobrevivência dos negócios. Mas um estudo anual conduzido pela empresa de relações públicas Edelman tem mostrado, repetidamente, que negócios familiares têm vantagem em termos de confiança dos consumidores em todos os países estudados.

Como ferramenta fundamental para o êxito dos negócios, a comunicação precisa ser feita de maneira efetiva, a partir de um plano bem definido, especificando os públicos e a prioridade em atingi-los, com a escolha do que vai ser comunicado e os canais a serem usados.

Pense em confiança como uma conta corrente que, em cada interação, há um crédito ou débito a partir do comportamento das partes. Por isso, é essencial saber utilizar o “direito de informar” dos acionistas, tendo em mente que ele afetará as relações necessárias para que o seu negócio prospere.

 

Publicado originalmente no Especiais para o Estadão. 18 de março de 2021