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Trabalhando em Empresas Familiares: Armadilhas Frequentes

“Qual é o problema? A empresa está indo à falência? Seremos vendidos?”

Para Charlie, que havia entrado no negócio da família dois anos depois de obter seu MBA e de ter ganhado experiência em outra empresa, essas perguntas do gerente da fábrica foram completamente inusitadas.

Ele estava ansioso para conquistar o respeito dos colegas, sem depender do seu sobrenome para garantir isso. Assim, fazia de tudo para ser apenas “mais um funcionário”. Preferia estacionar na parte de trás do prédio e atravessar a fábrica a pé, em vez de deixar o carro na vaga que lhe havia sido reservada na frente, perto dos escritórios. Na maioria das vezes, parava para conversar enquanto cruzava a fábrica, conhecendo seus colegas e aprendendo mais sobre as operações. Mas um dia em que chegava depois de fazer academia, o gerente da fábrica o surpreendeu com as perguntas sobre o futuro da empresa. Charlie o tranquilizou, garantindo que a empresa estava na realidade tendo um grande ano. De onde tinha surgido aquela preocupação?

Acontece que sete pessoas tinham ido falar com o gerente depois de ver Charlie chegando naquela manhã com uma cara estranha. Todos queriam saber: alguma coisa ruim estava para acontecer? A cara cansada não tinha nada a ver com o trabalho, mas até então não lhe havia ocorrido que todos o observavam assim. Embora sua experiência anterior e seu MBA tivessem sido inestimáveis para seu aprendizado, nenhum dos dois o tinha preparado para a realidade de trabalhar sob um microscópio.

Quando seu nome de família está na porta da empresa, você nunca será apenas mais um funcionário. E tudo o que fizer pode virar assunto de conversas no escritório. A partir daquele dia, Charlie, que veio mais tarde a se tornar o CEO da quarta geração da empresa familiar, fez uma promessa para si mesmo de que andaria todas as manhãs do carro para o escritório com a cabeça erguida e um sorriso no rosto, independentemente do que estivesse acontecendo.

Os líderes de negócios familiares com quem trabalhamos ecoam a experiência de Charlie. Eles sabem que suas ações, positivas ou negativas, são amplificadas por causa de sua posição como acionistas (ou futuros acionistas) da empresa. Mesmo gestos aparentemente anódinos – dirigir um carro de luxo, postar fotos com celebridades no Facebook ou se chamar de “dono” na frente de colegas – podem acabar por gerar má vontade.

Mas isso não precisa acontecer. Aqui estão algumas das armadilhas mais frequentes nas quais já vimos acionistas de negócios familiares caírem e como evitá-las.

Trabalhar na empresa pelas razões erradas. Quando os acionistas da família agem como se estivessem ali apenas para receber seu pagamento ou porque não têm outro lugar para ir, passam a mensagem de que os funcionários deveriam apenas tirar o máximo de proveito para si mesmos. É melhor transmitir a ideia de que você está interessado na empresa. Ao se mostrar entusiástico e demonstrar comprometimento com o negócio, graças a sua energia positiva e trabalho dedicado, você pode energizar os funcionários e estimulá-los a se concentrar mais na causa comum e menos nos ganhos estritamente pessoais.

Esperar promoções sem se dedicar ao trabalho. Quando membros da família começam na empresa em um nível que está acima de suas qualificações, ou são promovidos muito mais rápido do que merecem, outros funcionários tendem a procurar favoritismo mais do que mostrar desempenho quando pretendem fazer carreira na empresa. Ao entrar no negócio familiar, comece na base da pirâmide e trabalhe com afinco para chegar ao topo. Isso vai reforçar a mensagem de que a empresa é uma meritocracia.

Passar por cima da cadeia de comando para receber tratamento especial. Como você busca aprovação para suas ideias? Segue as regras e se dedica ao trabalho como qualquer pessoa? Com muita frequência, membros da família tiram proveito de seu acesso a parentes com cargos mais elevados, agindo como se as regras fossem maleáveis e procurando jeitos de contorná-las. Evite isso: siga a cadeia de comando, não peça tratamento especial de parentes e cumpra as regras de férias, despesas e horário de trabalho. Isso vai promover uma cultura de responsabilidade e reforçar a integridade dos processos de tomada de decisão da empresa.

Confundir as fronteiras entre os ambientes de casa e do trabalho. A política interna em negócios familiares fica ainda mais complicada quando os acionistas levam dinâmicas familiares para dentro da empresa, abrindo a possibilidade de funcionários jogarem membros da família uns contra os outros. É importante demarcar claramente as fronteiras do espaço de trabalho, por exemplo referindo-se às pessoas por seu nome em vez de sua relação pessoal (“Maria” no lugar de “Mamãe”) e não discutindo dramas familiares no escritório. Isso contribui para estabelecer um tom profissional.

Trabalhar na sua empresa familiar pode trazer grandes recompensas, mas também envolve muita responsabilidade. Como Charlie aprendeu, se você trabalha mais dedicadamente do que outros funcionários, está disposto a aprender desde o chão de fábrica e trata seu privilégio com modéstia, você tem mais chance de ganhar o respeito de seus colegas e manter em cheque as politicagens do escritório.

Alguns detalhes identificadores foram mudados para proteger a confidencialidade do cliente.

Artigo originalmente publicado em: Harvard Business Review, 06/11/2017. Tradução: Joana Canêdo